quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Quem acha que criança é boba não conhece Mafalda


Quem acha que criança só sabe brincar não conhece Mafalda, a personagem das tirinhas de Joquim Salvador Lavado, o Quino. A trajetória das histórias da pequena menina vai de 1964 a 1973. Sua primeira aparição foi no suplemento de humor da revista Leoplán. Em 29 de setembro de 64, o semanário “Primeira Plana”, de Buenos Aires, passa a publicar os quadrinhos regularmente. Mafalda trata dos direitos humanos por meio da sátira. Quem a lê achando que vai encontrar um humor pueril acaba por ser surpreendido e muitas vezes trapaceado pelo humor ácido e crítico. Para entender as tirinhas é preciso ter conhecimento do que acontece no mundo.
Para uma análise semiótica de Mafalda, vai-se usar a matriz da significação de Algidar Julien Greimas, que se diferencia da base teórica de Pierce e da semiologia, por dar ênfase “não mais nas relações entre os signos, mas no processo se significação capaz de gerá-los” (Pietroforte, 2004, p.7). Para entender o objeto de estudo, portanto, é preciso usar o percurso gerativo de sentido, que se concretiza no discurso. O principal ponto desta teoria é o semi-simbolismo, uma relação arbitrária (porque é fixada em determinado contexto), mas que também tem uma face que é susceptível a mudanças, criada da comunicação entre os dois planos de linguagem – que no caso das histórias em quadrinhos é o verbal e não-verbal.
Pietroforte apud Barthes (2006, p.1) diz da relação entre verbal (os balões da fala) e não verbal (os desenhos): “há o modo de ancoragem, em que o verbal reduz a polissemia da imagem, explicando-a; e há o modo de etapa em que o verbal e a imagem são fragmentos de um sintagma mais geral”. A segunda opção é a que acontece na tirinha, pois falas e desenho se complementam na geração de sentido de quem a lê.
Entra-se em um nível mais intenso de análise quando se pensa no semi-simbolismo. O globo terrestre do último quadrinho representa a terra como um todo. Não é apenas um objeto que não está bem, mas é o conjunto de relações sociais entre os indivíduos que está desvirtuado, ou seja, há uma relação entre mundo doente vs saudável, chamada de coerência semântica. Se esta existe é possível estabelecer uma coerência plástica: o último quadrinho refaz o sentido dos dois primeiros, pois de uma conversa banal entre duas crianças, agora se tem uma discussão sobre como anda o ambiente tanto social quanto físico em as pessoas vivem.
O semi-simbolismo e a sátira unem juntos para despertar no leitor uma inquietação sobre a vida. O mais interessante é que a própria Mafalda é um semi-símbolo – que representa toda uma sociedade. Além disso, ela desperta a relação maturidade vs pueridade, pois parece uma criança, e chega até a ser inocente em algumas tirinhas, mas tem falas de quem entende a vida e já passou por várias experiências.

Referências Bibliográficas

Pietroforte, Antonio Vicente. Semiótica visual - os percursos do olhar. São Paulo: Contexto, 2004.

Pietroforte, Antonio Vicente. O sincretismo entre a semiótica verbal e não verbal.Revista Intercâmbio, colume XV. São Paul: LAEL/ PUC - SP, 2006.

Pauline Frank de Almeida

Um comentário:

Dirce disse...

Pauline
"Analisar"a Mafalda é sempre apropriar-se de possibilidades comunicacionais para refletir sobre o dia a dia deste mundo doente, com inteligência e humor quase naif.
Ótima escolha e trabalho.
Dirce