quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Logomarcas e símbolos, a semiótica no cotidiano...


Gabriela Rebouças Milani Cecci

Desde que nascemos estamos habituados a reconhecer figuras, desenhos, formas geométricas etc. No entanto, as logomarcas comerciais ficam gravadas em nossas memórias e não importa quantos anos passem, somos capazes de reconhecê-las. Elas estão ligadas a semiótica por meio da reprodução simbólica (ou símbolo), que tem o intuito de representar uma instituição, como cita Adrian Frutiger: “Atualmente todos somos incluídos na economia moderna como consumidores. O espaço em que vivemos está repleto de bens de consumo, que se tornaram indispensáveis para a nossa existência. De certo modo, nosso dia só começa depois de passarmos os olhos pela marca familiar que vem impressa na embalagem do café. Todos os nossos caminhos estão marcados por símbolos, desde o primeiro sinal matinal até a última qualidade que vemos antes de dormir, gravadas do despertador.”




Um exemplo é a logomarca da Apple, que era famosa por seus computadores Macintosh mas que tornou-se muito mais conhecida pela febre do Ipod e mais recentemente do Iphone. Porém, essa marca não possui tal nome à toa. Ela foi criada primeiramente por seus donos, Steve Jobs e Robert Wayne a partir da idéia que remetia a conhecida maçã que levou Isaac Newton a teoria da gravidade, simbolizando a inspiração. A partir daí foi criada a primeira logomarca, como se vê ao lado, ilustrando Newton embaixo da macieira com apenas uma maçã sendo iluminada. Contudo, essa imagem nunca seria facilmente memorizada pelas pessoas pois demonstra algo antigo e sem cores. Assim Steve Jobs e Stephen Wosniak, outro dono da companhia, decidiram criar uma maçã mordida, como se com ela pudéssemos adquirir conhecimento e sabedoria dando até hoje a Apple um símbolo diferente e colorido, que marca a empresa e tornando-a mais acessível ao pensamento de seus clientes.
Outro símbolo que se tornou um destaque foi o da rede Carrefour. Não importa o país que você esteja, ele sempre será o mesmo, sendo como a Apple um símbolo universal. A marca original que identifica o Carrefour até os dias atuais foi criada em 1966, por Jacques Daniel. O curioso é que muitas vezes demoramos a perceber que o desenho não se trata de um bonequinho ou uma flecha, mas sim de um “C” branco sobreposto a um losango azul e vermelho, que homenageiam as cores da bandeira francesa.


No entanto existem marcas que por sua tamanha importância e influência no mundo acabaram se tornando ícones, que segundo o Dicionário de Semiótica de A. Greimas significa “um signo definido por sua relação de semelhança com a realidade do mundo exterior”. É o caso da Coca-Cola, McDonald’s, BMW, Adidas, Nike e muitas outras. Aldemira Assis Drago, especialista em Marketing defende que “os logos, como símbolo visual, conferem visibilidade e legibilidade às marcas e ajudam afixar o nome e a imagem que o compõem [...] porque a força do nome repousa no seu significado na mente do consumidor. E como os logos se constituem em imagem fixa da marca, nesse caso, eles acabam indo para o segundo lugar”.
Devido a sua tamanha abrangência, a semiótica talvez seja uma das mais importantes ciências estudadas, pois se aplica ao nosso convívio, sociedade e meios de comunicação de forma direta, interferindo não só no que representa, mas em toda sua significação.


Referências:

DEELY, John. Semiótica básica. São Paulo: Ática, 1990.
DRAGO, Aldemira Assis. Marca: identidade e significado emocional do produto. 2004. www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/artigos_revistas/258.pdf

EPSTEIN, Isaac. O signo. 7. ed. São Paulo: Ática, 2002.
FRUTIGER, Adrian. Sinais e símbolos: desenho, projeto e significado. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
GREIMAS, A. J. ; COURTÉS, J. Dicionário de Semiótica. São Paulo: Cultrix, _.
SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2007.
_____________. Teoria geral dos signos: como as linguagens significam as coisas. São Paulo: Pioneira, 2000.
Imagens disponíveis em: Google Imagens – Apple, Carrefour.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Signos, índices e alguns fantasmas!

Olá assíduos leitores deste aclamado blog. O ano letivo está chegando ao fim, assim como minha paciência. Isso mesmo! Estou farto de escrever toneladas de palavras da maneira mais erudita e intelectual de que sou capaz (e sinceramente não sou tããão capaz nisso). Vocês sabem, produzir artigos e mais artigos cansam um pouco nossa cabeça. Tem hora que as palavras já nos faltam e parece que mais nada do que escrevemos faz algum sentido. Por estas e outras razões, decidi escrever meu texto na linguagem mais coloquial possível (relaxa, não haverá palavrões nem termos de baixo calão). Até porque este blog trata de “códigos e sistemas de comunicação” não é verdade?! Então, não façamos da comunicação algo penoso e de difícil compreensão. Introduzindo isso, vamos lá.

Meu objeto de análise será um clipe do qual gosto muito. É da banda canadense Nickeback e a música chama-se Someday. Confesso que não sou muito fã do grupo, mas o clipe é realmente bom (“qualé”, não posso emitir minha opinião? Dirce, não tire minha nota!). Continuando... a canção foi lançada em 2003 e é incorporada ao álbum The Long Road. Antes de prosseguir na leitura (isso se você já não desisitiu) acesse o link abaixo para assistir o vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=3c9RmtC-8mI

Pronto? Assistiu mesmo? Gostou? Não importa, pois vou continuar falando do clipe até o fim do texto. Primeiro quero falar que não vou fazer uma análise semiótica da música, mas sim da narrativa do vídeo. Pois bem, como já fora muito citado neste blog autores como Santaella, Eco e Barthes, não pretendo cair em repetição. No entanto, colocarei aqui, de maneira resumida e indireta, algumas idéias básicas destes ilustres autores referentes à semiótica e a semiologia.

Conceitua-se como Semiótica a ciência que estuda as formas de linguagem nas suas mais variadas formas de aparição. Se por um lado a Lingüística tem como principal objeto de estudo as linguagens orais e escritas, a Semiótica, mais abrangente, procura compreender o funcionamento de toda forma possível de linguagem, inclusive as não-verbais, como as imagens, cores, sons, músicas, entre outros exemplos. A complexidade humana situa-se na capacidade cognitiva de processar informações por meio de determinadas linguagens. Sendo assim, a competência comunicativa de poder significar as coisas e os fenômenos e de poder transmiti-los em conteúdos apreendidos é o fator que nos diferencia do restante dos animais.

Uma peça fundamental para a semiótica é o conceito de signo. Entende-se por signo uma coisa que se coloca no lugar de outra coisa com o objetivo de representá-la. Para esclarecer, o signo não é o objeto, mas sim a REPRESENTAÇÃO deste objeto. Sendo assim, o signo só possui valor de uso ao se estabelecer na mente de alguém, o que logo desencadeia em um processo chamado de interpretante. O interprete (aquele que interpreta) ao contatar a representação do objeto, haverá de produzir em sua mente não o objeto direto, mas sim seu signo. Não é preciso, por exemplo, que uma maçã esteja no alcance da visão de dois indivíduos para que eles possam formar idéias sobre uma maçã por meio de signos. Difícil? Ninguém disse que ia ser fácil, parceiro!

O clipe de Someday está repleto de signos de toda a sorte. Aliás, o próprio clipe é um signo. Toda sua narrativa é construída a base de signos que nos chegam aos olhos e que nos permite processá-los em nossa mente, tornando-os quase “reais”. Os signos vão constantemente sobrepondo-se uns aos outros na telinha do YouTube à medida que a narrativa vai sendo traçada. A mulher chorando, o homem confuso e desesperado, o leite derramado, o trânsito, os carros etc., todos estes elementos, ops, signos constroem um signo total (o clipe narrativo) que traz uma mensagem maior que todos os outros signos menores e que dá sentido a toda narrativa: a morte de ambos os protagonistas.

Suponhamos que esta seja a primeira vez que você viu o clipe. A mulher fica em prantos quando vê algo no jornal. Oh, mas o que será? Mas daí ela passa a ignorar completamente o homem ao seu lado. Bom, eles podem ter brigado, ela pode tê-lo visto no jornal com outra mulher, enfim, as opções são inesgotáveis. Mas aos 00:29 ela pega uma camiseta do cara e começa e guarda na mala. Eles não estariam brigados?! Por que ela iria querer uma camiseta do homem que ela não consegue nem mais olhar nos olhos? Estranho... Bom, gente, não vou narrar todo o clipe aqui por motivos óbvios. O que quero dizer é que só conseguiremos captar o sentido e a mensagem da narrativa quando esta chega ao fim. É então que podemos processar os signos e perceber a coerência de toda a história.

Ah, não venha me dizer que você já tinha sacado o fim do clipe logo no começo ou no meio. Bom, talvez até tenha, pois além de signos puros o vídeo também traz alguns índices bem sutis de que o cara é um fantasma! Aos 00:52 o rapaz pisa no leite e por algum fenômeno sobrenatural, literalmente, ele não deixa pegadas brancas no chão! Belo índice de que ele pode ser um ser incorpóreo, noá?! No 01:31, enquanto o carinha corre alucinadamente atrás do carro da garota, ela olha no retrovisor e não vê ninguém perseguindo-a. Vai que ele é um vampiro e não tem reflexo! Aí estão algumas pequenas pistas, ops, índices que podem ajudar a desvendar o mistério assombrado do clipe.

Bom meus amigos(as), por hoje é só. Gostaria de parabenizar todos aqueles que conseguiram, devido à persistência ou à falta de coisa melhor pra fazer, chegar até o fim deste texto repleto de piadinhas infames (bem ao meu gosto) e cheio de parênteses (nada a acrescentar). Até a próxima.

Luis Antonio Palma Hangai

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

“Na onda do ecologicamente correto”...



Nara Dyeynne Marques Chiquetti

Políticas ecologicamente corretas estão em alta. Preservação ambiental, reciclagem de produtos, entre outras estão todos os dias na mídia – em matérias e campanhas. Ganham pontos as empresas que se mostram “ecologicamente corretas”. Geralmente a parte que fazem é a exigida por lei, o mínimo que deveriam, mas são vistas com bons olhos pela sociedade e também não perdem a oportunidade de fazer marketing em cima disso.
Com base na semiótica e em autores de marketing e propaganda, vamos olhar para a propaganda de forma “diferente” (tanto em seus aspectos verbais quanto não-verbais). Esta é a análise de uma campanha institucional. Trata-se da nova campanha da Chevrolet, “Reinventamos Caminhos”, que tem por objetivo a conscientização para o consumo responsável. Portanto, a finalidade não é o destaque de um de seus produtos, mas da empresa “Chevrolet”, que quer mostrar que faz sua parte para a preservação ambiental. A propaganda analisada foi veiculada em uma revista semanal e de circulação nacional.
O título do texto é: “Quem tem o poder de ORGANIZAR e de EVOLUIR tem o poder de MUDAR.” Para simbolizar a parte do trabalho da empresa para a preservação ambiental, ela se põe como uma formiguinha em relação à natureza. Seu tamanho é pequeno, o trabalho é de pouquinho em pouquinho, mas unidas, as formigas fazem um grande esforço todos os dias para construção e manutenção do formigueiro. É isso que a empresa quer transmitir, a consciência de que sua iniciativa é pequena, mas se seus clientes e outras empresas aderirem à campanha, o “trabalho de formiguinha” dará resultado. Porque o sujeito a quem se refere o “poder” é o homem – ele se organiza, evolui a cada dia e pode também mudar certos “hábitos” em prol do planeta (faz parte da campanha o consumo consciente, a reciclagem de materiais e até a sugestão na economia com transporte por meio de caronas).
Na imagem vê-se o quão pequena é a formiga pela comparação com os outros elementos que compõe o quadro, como as raízes da árvore ou até mesmo em relação às flores. A imagem é de campo aberto, mostra um vale entre montanhas, tudo isso para destacar que são os serezinhos que influenciam em tudo, até à mais alta montanha. A formiga simboliza as pessoas que trabalham pela preservação da natureza. Além disso, todas caminham para o mesmo lado, para o mesmo objetivo, representando a união. O pôr do sol dá à imagem o tom dourado da logomarca Chevrolet (o símbolo da empresa).
Os carros que as formiguinhas carregam representam os produtos flex da Chevrolet, que poluiriam menos, por isso seriam mais ecológicos – uma ajuda à preservação ambiental. Essa campanha não está só preocupada com a natureza, mas principalmente em aliar esse diferencial à marca (“empresa ecologicamente correta”). Pois a marca representa a empresa e é referência de seus produtos. Uma campanha de qualidade une boa imagem da empresa com qualidade de produtos – é o que pretende esta campanha.


Bibliografia consultada:

CORRÊA, Roberto. Contato Imediato com Planejamento de propaganda. 2 ed. Rio de Janeiro: Global, 1987

PINHO, J. B. O poder das marcas. São Paulo: Summus, 1996.

SAMPAIO, Rafael. Propaganda de A a Z. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Campus, 2003.

SANT’ANNA, Armando. Propaganda: teoria, técnica e prática. 7 ed. rev. e atual. de 1998. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2007.

VESTERGAARD, Torben; SCHRODER, Kim. A linguagem da propaganda. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004

Imagem disponível em: http://www.reinventamoscaminhos.com.br/campanha.html. Acesso: 26/11/08. 20:54

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Quem acha que criança é boba não conhece Mafalda


Quem acha que criança só sabe brincar não conhece Mafalda, a personagem das tirinhas de Joquim Salvador Lavado, o Quino. A trajetória das histórias da pequena menina vai de 1964 a 1973. Sua primeira aparição foi no suplemento de humor da revista Leoplán. Em 29 de setembro de 64, o semanário “Primeira Plana”, de Buenos Aires, passa a publicar os quadrinhos regularmente. Mafalda trata dos direitos humanos por meio da sátira. Quem a lê achando que vai encontrar um humor pueril acaba por ser surpreendido e muitas vezes trapaceado pelo humor ácido e crítico. Para entender as tirinhas é preciso ter conhecimento do que acontece no mundo.
Para uma análise semiótica de Mafalda, vai-se usar a matriz da significação de Algidar Julien Greimas, que se diferencia da base teórica de Pierce e da semiologia, por dar ênfase “não mais nas relações entre os signos, mas no processo se significação capaz de gerá-los” (Pietroforte, 2004, p.7). Para entender o objeto de estudo, portanto, é preciso usar o percurso gerativo de sentido, que se concretiza no discurso. O principal ponto desta teoria é o semi-simbolismo, uma relação arbitrária (porque é fixada em determinado contexto), mas que também tem uma face que é susceptível a mudanças, criada da comunicação entre os dois planos de linguagem – que no caso das histórias em quadrinhos é o verbal e não-verbal.
Pietroforte apud Barthes (2006, p.1) diz da relação entre verbal (os balões da fala) e não verbal (os desenhos): “há o modo de ancoragem, em que o verbal reduz a polissemia da imagem, explicando-a; e há o modo de etapa em que o verbal e a imagem são fragmentos de um sintagma mais geral”. A segunda opção é a que acontece na tirinha, pois falas e desenho se complementam na geração de sentido de quem a lê.
Entra-se em um nível mais intenso de análise quando se pensa no semi-simbolismo. O globo terrestre do último quadrinho representa a terra como um todo. Não é apenas um objeto que não está bem, mas é o conjunto de relações sociais entre os indivíduos que está desvirtuado, ou seja, há uma relação entre mundo doente vs saudável, chamada de coerência semântica. Se esta existe é possível estabelecer uma coerência plástica: o último quadrinho refaz o sentido dos dois primeiros, pois de uma conversa banal entre duas crianças, agora se tem uma discussão sobre como anda o ambiente tanto social quanto físico em as pessoas vivem.
O semi-simbolismo e a sátira unem juntos para despertar no leitor uma inquietação sobre a vida. O mais interessante é que a própria Mafalda é um semi-símbolo – que representa toda uma sociedade. Além disso, ela desperta a relação maturidade vs pueridade, pois parece uma criança, e chega até a ser inocente em algumas tirinhas, mas tem falas de quem entende a vida e já passou por várias experiências.

Referências Bibliográficas

Pietroforte, Antonio Vicente. Semiótica visual - os percursos do olhar. São Paulo: Contexto, 2004.

Pietroforte, Antonio Vicente. O sincretismo entre a semiótica verbal e não verbal.Revista Intercâmbio, colume XV. São Paul: LAEL/ PUC - SP, 2006.

Pauline Frank de Almeida

Você já parou para analisar um rótulo? Se a resposta for “não”, talvez seja a hora de pensar outra vez. Uma imagem, uma combinação de cores, o simples desenho de uma letra... tudo é comunicação. E, acredite, mesmo que você nunca tenha se debruçado sobre uma logomarca, os sentidos que ela tenta passar já foram absorvidos – e você nem percebeu! Isso porque, como explica Santaella (2004, p.10), “[..] imagens, gráficos, sinais, setas, números, luzes [...], objetos, sons musicais, gestos, expressões, cheiro, tato [...]” são formas de linguagem e, por isso, produzem sentidos.
A Semiótica é a ciência voltada para os estudos da linguagem – entendam-se aí todas as formas possíveis. Sim, pois sempre que estamos representando alguma coisa, colocando algo no lugar de algo, estamos falando de signos – e falar de signos é falar de Semiótica. E o que tudo isso tem a ver com o Guaraná Antarctica? Muito mais do que você imagina...
Tomemos, por exemplo, o formato das letras da marca. De acordo com Alves (1982, p.291), a escrita “[...] apresenta-se como um sistema de signos que traduz para um nível visual (representação gráfica) o desempenho oral do código verbal. [...] É a representação de uma representação. Signo de um signo”. Então se o desenho de uma letra é um signo, isso quer dizer que ele, por si só, já é capaz de comunicar. E não pense que isso passa despercebido, não. A tipografia, ciência que estuda os atributos visuais da linguagem escrita, tem exatamente como função transmitir a mensagem “[...] do modo mais eficaz possível, gerando no leitor destinatário significações pretendidas pelo destinador”. (NIEMEYER, 2003, p.12).
Os tipos utilizados para escrever a palavra Guaraná são do grupo Manuscrito, ou seja, eles imitam a escrita cursiva. Quando vemos esse tipo de letra, a idéia que temos (mesmo que inconsciente) é de personificação – até parece que foi escrito só para gente, ali, à mão. Além disso, o formato mais arredondado, o equilíbrio entre as curvas e a leveza dos traços remete ao feminino. O Guaraná é quase uma moça delicada, pisando na ponta dos pés, toda graça, deslizando de uma ponta à outra da garrafa.
O ANTARCTICA, por sua vez, com seus tipos sem serifa da família Etrusca, faz um contraponto ao movimento do manuscrito. As letras em caixa alta conferem destaque e o contraste entre as hastes, credibilidade. Apesar de serem mais simples e sérios, os tipos mantêm a elegância, sustentando a feminilidade. O mesmo se estende ao slogan O ORIGINAL DO BRASIL, que conserva o desenho de cima e reitera a questão da simplicidade, mas com impacto - repare que é a única frase vazada em branco na cor vermelha. E cor faz diferença? Se faz!
Segundo Farina (2006, p.13), a cor, enquanto comunicação visual “[...] exerce uma ação tríplice: a de impressionar, a de expressar e a de construir. A cor é vista: impressiona a retina. E sentida: provoca uma emoção. E construtiva, pois, tendo significado próprio, tem valor de símbolo e capacidade, portanto, de construir uma linguagem própria que comunique uma idéia”. Assim como os tipos, as cores também necessitam de ferramentas e registros de transmissão, afinal, elas não são repassadas hereditariamente, mas por meio de regras convencionadas e arbitrariamente definidas. Então, encarando a estruturação comunicativa cromática como predominantemente invariável, analisemos as cores do Guaraná.
A cor vermelha, do tipo quente, confere proximidade, calor, estímulo, excitação. Remete à noções de alegria, energia, dinamismo, movimento. E, frequentemente, é associada aos lábios, à mulher, ao doce. Já o branco é mais “comportado” e por isso, de grande contraste com o vermelho. Ele desperta simplicidade, limpeza, sensação de bem estar, de estabilidade. O verde, por fim, sugere “umidade, calma, frescor, esperança, amizade e equilíbrio. Além de todas as conexões com a Ecologia e com a natureza”. (FARINA, 2006, p.101). E essa combinação toda vai dar o quê?
Charme e sensualidade. As letras essencialmente femininas se casam com o vermelho e balanceiam-se com o branco. O verde, enquanto cor predominante da embalagem do refrigerante sustenta a logomarca como se fosse a folhagem que circula a flor, a fruta, ou, no caso, o guaraná.
O que temos, então? Um marca extremamente feminina, de movimento, balanço, doçura, charme, leveza e frescor. E, tenha certeza, você já sabia disso antes mesmo de ler esse texto – até porque é exatamente essa função da publicidade: atrair, provocar sentidos, seduzir e, assim, vender.


Referências Bibliográficas

ALVES, Leange Severo. Estudo do código visual originado do código verbal na linguagem jornalística. Revista Semina, n.12, cap. 3, p. 291-296, 1982.

FARINA, Modesto. Psicodinâmica das cores em comunicação – 5ª. ed. São Paulo: Edgard Blucher, 2006.

NIEMEYER, Lucy. Tipografia: uma apresentação – 3ª. ed. Rio de Janeiro: 2AB, 2003.

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2004.

Imagens
Google Imagens



terça-feira, 18 de novembro de 2008

Chinelos e semiótica



O anúncio publicitário é das Hawaianas Kids e foi publicado em uma revista de circulação semanal.

Nós vamos analisar essa propaganda em seus aspectos verbais e não-verbais. Para isso, vamos usar a Semiótica, que segundo Santaella estuda aquilo que vai além das palavras, “Portanto, quando dizemos linguagem, queremos nos referir a uma gama incrivelmente intrincada de foras sociais de comunicação e de significação que inclui a linguagem verbal articulada, mas absorve também, inclusive, a linguagem dos surdos-mudos, o sistema codificado da moda, da culinária e tantos outros”.

A primeira característica que chama nossa atenção nesse anúncio é a coloração. A imagem é colorida e usa principalmente as cores azul, preto e roxo que costumam remeter a escuridão, incertezas e medo. A imagem de fundo é noturna, de um local pouco habitado e perto de um cemitério. Essa paisagem remete a desenhos infantis e filmes que abordam lugares mal assombrados que causam medo nas crianças.

É quase unânime entre as crianças o medo do escuro, por exemplo, ou de dormirem sozinhas. Nesse caso, outra figura conhecida delas é o mostro que poderia morar no armário ou em baixo da cama.

Outra característica importante na imagem é o fato dela estar colocada em uma moldura de madeira com cortinas. Alem disso, a lua e as palavras estão penduradas por uma linha, o que nos faz lembrar de teatros infantis com fantoches.

De acordo com a Semiótica, um signo é a representação de algo. De acordo com Pierce, essa representação precisa unir três elementos: índice, ícone e símbolo.
O ícone é uma representação simbólica do objeto ou apenas de uma parte dele, já o índice é aquilo que o objeto pode representar. Por sua vez, os símbolos são representações convencionadas.

Nessa propaganda, podemos classificar todo o desenho da paisagem como sendo um ícone porque se trata de uma representação simbólica, que nos remete a imagem real.
Também não podemos esquecer a parte verbal do anúncio. São duas perguntas “Se existe um monstro em baixo da cama do seu filho? Depende de onde ele guarda as Hawaianas?”. Essas frases ajudam a completar o sentido do informe publicitário, chamando atenção para as Hawaianas que têm o desenho de um monstro. As Hawaianas, nesse caso, são um ícone, já que representam um chinelo infantil. Entretanto, o monstro estampado no chinelo também pode ser considerado um símbolo, porque é uma representação convencionada de algo que assusta as crianças e que assume essa forma e essas cores.

Beatriz Fontana Assumpção


Referência Bibliográfica:

SANTAELLA, Lucia. O que é semiótica. São Paulo. Brasiliense, 1983

http://www.webquest-letras.com.br/propaganda_para_quem.htm

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Ciência dos Signos?




Por Bruna Komarchesqui

Escrevo esse texto para você, caro leitor, que se deliciou com todas as análises aqui postadas, mas que ainda tem uma duvidazinha chata rondando os pensamentos: “Tá, mas o que exatamente é semiótica?”. Segundo Santaella (2005, p.7): “O nome Semiótica vem da raiz grega semeion, que quer dizer signo. Semiótica é a ciência dos signos”. Aí você fica na dúvida: “Ué, signos? Aqueles do zodíaco? Então, a astrologia também é estudada nas universidades?”. E essa confusão é mais comum do que parece. Os signos estudados pela semiótica nada têm a ver com astrologia (se bem que uma relação entre eles não seria de tudo absurda). De maneira simplificada, no caso da semiótica, “[...] signo é algo que está por outra coisa”. (EPSTEIN, 1990, p.17). Ou ainda: signo é algo no lugar de algo.

Resolvida essa questão, surge uma outra: “Por que alguns autores falam em Semiologia e outros em Semiótica?”. Santaella (2005) explica que a diferença entre essas duas “ciências” não fica apenas no nível da terminologia. Deixando um pouco de lado os demais pontos de discordância e de concordância entre elas, vamos nos ater na diferença de abordagem que cada uma faz da questão do signo.

Umberto Eco, em seu “Tratado Geral de Semiótica” (2003), traz um panorama de como os signos são tratados pelas duas linhas, que têm como representantes/pioneiros Ferdinand Saussure (Semiologia) e Charles S. Peirce (Semiótica). A Semiologia saussureana seria, então, “[...] uma ciência que estuda os signos no quadro da vida social; ela poderia fazer parte da psicologia social, e, em conseqüência, da psicologia geral”. (ECO, 2003, p.9). Saussure define o signo como uma “entidade de dupla face”. Para ele, o signo é composto de “significante” (imagem acústica, mediador material do significado, elemento do signo que impressiona nossos sentidos) e “significado” (interpretação de um signo). Ou seja, a soma dos dois forma o signo. “Expressão e conteúdo, significante e significado são os correlatos da função sígnica na semiologia de raiz saussureana. O signo significa, isto é, aponta para fora de si (tomando-se aqui o signo como equivalente à sua expressão ou significante, para opô-lo ao conteúdo ou significado).” (EPSTEIN, 1990, p.21).

Já a semiótica peirceana entende o signo como “[...] qualquer coisa que está para alguém no lugar de algo sob determinados aspectos ou capacidades. [...] Um signo pode estar para algo aos olhos de alguém somente porque essa relação (estar-para) é mediada por um interpretante”. (ECO, 2003, p.10). Para Peirce, a relação do signo é sempre uma tríade (nunca uma dupla, como defendia Saussure). Um exemplo seria: um signo, seu objeto e o seu interpretante. Epstein (1990, p.48) explica que Peirce classifica os signos de acordo com sua função sígnica, dividindo-os em três tricotomias: a relação signo-meio, signo-objeto e signo-interpretante. Na relação signo-objeto, o signo pode ser um ícone (objeto possui certos traços em comum com o objeto referido, exemplo, uma fotografia), um índice (relação entre signo e objeto é direta, por exemplo, fumaça indicando fogo) ou um símbolo (relação signo-objeto independe de semelhança ou relações de causa entre eles, mas é definida por uma lei convencionada).

Para Eco (2003, p.11), uma das diferenças entre Semiologia e Semiótica é que a definição peirceana “[...] não requer como condição necessária para a definição do signo, que este seja emitido INTENCIONALMENTE e produzido ARTIFICIALMENTE”. Além disso, a tríade peirceana pode se aplicar a fenômenos que não tenham emitente humano, mas tenham destinatário humano, como no caso dos fenômenos meteorológicos, ou outros tipos de índice. Resumidamente, as semióticas (o termo pode ser usado tanto para designar Semiótica ou Semiologia) de Saussure e Peirce são “[...] teorias da relação ‘semiósica’ entre símbolo e referência (ou significado) e entre o signo e a série de seus interpretantes. Os objetos não são levados em consideração por Saussure e, no quadro teorético de Peirce, só entram quando se discutem tipos particulares de signos, como os índices e os ícones”. (ECO, 2003, p.51).

Entendidas algumas diferenças e semelhanças, voltemos ao início: como seria possível uma relação entre semiótica e astrologia? Roland Barthes, em seu livro “Mitologias”, faz uma análise da astrologia que, para ele, é um “sistema mítico”. “O mito é uma fala [...], um sistema de comunicação, é uma mensagem.” (BARTHES, 1993, p.131). Nesse sentido, Barthes considera a semiologia uma “ciência das formas” que estuda as significações independentemente dos conteúdos. Na perspectiva semiológica, então, os signos do zodíaco podem ser estudados enquanto signos com significante e significado. “O significado é o conceito, o significante é a imagem acústica (de ordem psíquica), e a relação entre o conceito e a imagem é o signo (a palavra, por exemplo)”. (BARTHES, 1993, p.135). Por meio da palavra escrita, os signos do zodíaco exercem sua significação. Muitas outras relações com a semiótica seriam possíveis, como um estudo dos símbolos que representam cada signo do zodíaco, de como a posição dos planetas interfere no “destino” das pessoas, etc.

Mas Barthes se concentra num ponto específico. Para ele, a astrologia (ele analisa o caso francês) não traz aberturas para o sonho, mas é mero espelho da realidade instituída. Ou seja, os astros (o horóscopo) nunca estimulam uma superação da ordem, mas respeitam os “estatutos sociais e os horários patronais”. Ao invés de predizer o futuro, os astros, na maioria das vezes, descrevem problemas e situações da vida cotidiana. A utilidade da astrologia, para Barthes, seria a mesma da Literatura: objetivar o real, sem chegar a desmistificá-lo, ou, em outras palavras, “exorcizar o real, nomeando-o”. (BARTHES, 1993, p.109).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARTHES, Roland. Mitologias. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1993.

ECO, Umberto. Tratado geral de semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2003.

EPSTEIN, Isaac. O signo. São Paulo: Ática, 1990.

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2005.

IMAGEM:
http://ela2.wordpress.com/2008/05/09/e-os-astros-contam/

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Dicionário literário sobre amor



FRAGMENTOS DE UM DISCURSO AMOROSO. Divagações e momentos de reflexão sobre o amor, que gradativamente compõem o que é o discurso amoroso – um discurso que, como o próprio autor afirma, esquece do outro.

(Barthes) 1. “A necessidade deste livro se apóia na seguinte consideração: o discurso amoroso é hoje em dia de uma extrema solidão. Este discurso talvez seja falado por milhares de pessoas (quem sabe?), mas não é sustentado por ninguém; foi completamente abandonado pelas linguagens circunvizinhas: ou ignorado, depreciado, ironizado por elas, excluído não somente do poder, mas também de seus mecanismos (ciências, conhecimentos, artes). Quando um discurso é dessa maneira levado por sua própria força à deriva do inatual, banido de todo espírito gregário, só lhe resta ser o lugar, por mais exíguo que seja, de uma afirmação. Essa afirmação é em suma o assunto do livro que começa.” (Barthes, 1997: 12)

2. O livro, construído de maneira literária, não se propõe a ser didático como outros títulos do autor. É como se Barthes estivesse se expressando em um diário. No entanto, embora seja de cunho pessoal, o livro se torna universal nas palavras que descreve, como “Eu-te-amo” e “Lembrança”. Notando essa universalidade e transportando para a Semiologia, a linguagem amorosa parece um Sistema em que o Sintagma está subentendido em qualquer parte do mundo (a linguagem amorosa como Sistema é um conjunto de gestos, entonações e comportamentos típicos dos apaixonados, enquanto o Sintagma seria a cumplicidade de um casal ou das pessoas ao redor ao notar a conduta dos apaixonados). Em ordem alfabética, o autor francês escolhe algumas das palavras mais presentes no cotidiano dos amantes e utiliza a literatura (Freud, Nietzsche, Goethe, Lacan...) e a metalinguagem para definir uma a uma, tal qual um dicionário.

(Closer) 2. A fala da personagem de Natalie Portman retrata exatamente o que Barthes dizia sobre “Eu-te-amo”: “Where is this love? I can't see it, I can't touch it. I can't feel it. I can hear it. I can hear some words, but I can't do anything with your easy words.” (Onde está esse amor? Eu não o vejo, eu não o toco. Eu não o sinto. Eu consigo ouvi-lo. Eu ouço algumas palavras, mas eu não posso fazer nada com suas palavras fáceis.) Para Barthes, “Eu-te-amo” seria, depois da confissão inicial, uma repetição, ou ainda, um aposto (“Fulano, eu-te-amo”). O termo não adquire valor nem mesmo quando contextualizado e compreendido (e podemos aplicar aqui a Semiologia, quando Barthes distingue a Fala e a Língua. A Língua seria um sistema consentido, posterior à Fala que é uma tentativa de comunicação). A frase só teria sentido no momento em que foi pronunciada, no seu dizer imediato.

(Eternal Sunshine of the Spotless Mind) 3. O filme é constituído de digressões do personagem de Jim Carrey, que são relatos do seu dia-a-dia com a ex-namorada Clementine (atuada por Kate Winslet). São exatamente estas memórias que correspondem ao que Barthes chama de “Lembrança”: detalhes corriqueiros do casal que estão ligados ao ser amado e que para que Joel esqueça a personagem Clementine, é necessário que ele se livre de todos os pertences, objetos e pensamentos que o conectavam a ela – sejam elas boas lembranças ou dolorosas. Joel, já apagado das lembranças de Clementine, seria um Signo sem Significado. “O signo é, pois, composto de um significante e um significado. O plano dos significantes constitui o plano de expressão e o dos significados o plano de conteúdo” (Barthes, 1979: 43).

Texto: Claudia Yamaki
A disposição do texto foi propositadamente semelhante à diagramação do livro “Fragmentos de um discurso amoroso”, sendo, portanto, original do autor.

Para compreender melhor:
Filmes:
Closer – Perto Demais
Título original: Closer
Tempo de Duração: 100 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2004
Direção: Mike Nichols

Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças
Título original: Eternal Sunshine of the Spotless Mind
Tempo de Duração: 108 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2004
Direção: Michel Gondry

Referências:
BARTHES, Roland. Elementos de Semiologia. São Paulo: Cultrix, 1979.
BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1997.

Imagem:
Google Imagens, editada no Adobe Photoshop CS3

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Pensando o "verde"

Análise do vídeo "The Green Song" da campanha MTV Switch
vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=Bg0QminAPMM

Natália Rodrigues

Na efervescência das discussões sobre o aquecimento global, expressões como “pensar verde”, “respeito ao verde”, “preservação do verde”, se tornaram quase obrigatórias para se promover uma dita consciência ambiental. Aliás, neste cenário apocalíptico de mudanças catastróficas, o verde é o novo preto. Ser “verde” está na moda. E é esta apropriação da palavra como um adjetivo que supostamente traz embutido todos os valores de consciência e preservação ambiental – mas que na verdade tem funcionado como um meio de “marketização” do consumo responsável – que é abordada ironicamente neste vídeo da Campanha Switch da MTV – criada pela emissora para alertar seu público sobre o problema do aquecimento global.

O vídeo traz uma canção que fala sobre a gravidade da situação e o modo como as pessoas estão lidando com ela. Por meio da ironia, a mensagem que transmite é a de que nenhuma grande mudança está sendo promovida, tem-se apenas o “bombardeio” de discursos e produtos que se dizem ecologicamente corretos, mas que assim se mostram simplesmente por se apropriarem da palavra verde, atribuindo a ela um novo conceito. O “verde” é o elemento central para se compreender a intencionalidade do vídeo.

Mas o que é o “verde”? De acordo com a semiótica peirceana, a cor, sendo um signo, ou seja, aquilo que representa alguma coisa para alguém, pode ser apreendida pela consciência, para a formação do pensamento, de três modos (categorias) diferentes: a primeiridade, a secundidade e a terceiridade.

A primeiridade, segundo Santaella (2007), se refere à impressão imediata constituída em nossa consciência, sendo, então, original e espontânea, liberta da necessidade de comparação, interpretação ou análise. Esta apreensão inicial da cor se limita meramente à sua qualidade (quali-signo). O verde que aparece no vídeo, quando apreendido ao nível da primeiridade, não estabelece, portanto, relação com nenhum objeto.

Já a secundidade está relacionada à existência, à corporificação material responsável pelas sensações inerentes ao processo de troca de estímulo e reação entre seres e objetos. Se a “qualidade da cor” – quali-signo - é algo totalmente abstrato, a sensação que um espaço todo verde nos transmite é uma secundidade.

Na análise em nível da terceridade, a cor verde é classificada como um legi-signo, correspondendo a uma lei que, por convenção, determina que aquele signo – a palavra ‘verde’ - represente seu objeto. Portanto o “verde”, presente no vídeo, faz referência à natureza, que, convencionalmente, é representada por essa cor.

Mas para compreender o verdadeiro sentido assumido pela palavra “verde” nesta mensagem publicitária, devemos nos aprofundar em uma análise semiológica, que, por sua vez, estuda a significação no seio da vida social. “Sendo a significação um acontecimento, sobretudo social, estudá-la como tal faz com que a semiologia, de algum modo, adquira certa função na sociedade” (SILVA, 2005). Deste modo, a análise dos signos na semiologia leva em conta questões de ordem social e histórica. E são essas que se encontram embutidas na significação da palavra “verde”, no contexto apresentado no vídeo.

Para apreender o novo conceito atribuído ao termo “verde” – aquele que tratamos no início do texto, que se refere à apropriação da palavra para denominar um suposto “consumo responsável” - é preciso ter conhecimento do contexto, que envolve, neste caso, o aquecimento global e a postura adotada pelas pessoas – empresas, políticos, celebridades... – diante do problema.

A atribuição deste novo sentido à palavra pode ser explicada pelo fato de que, segundo Barthes (1985, p.97), “os significados comunicam-se estreitamente com a cultura, o saber, a História; é por eles que, por assim dizer, o mundo penetra o sistema”.

A interferência cultural na interpretação dos signos também é definitiva para a interpretação da mensagem final do vídeo: “Você não precisa ser ‘verde’ para ser ‘verde’”. Neste caso, tem-se dois significados, que, por influência da cultura e do contexto, são atribuídos a uma mesma palavra. A conceituação dada à palavra ‘verde’ no início da frase diz respeito àquela que definimos no começo do texto – e no parágrafo acima. Já a segunda utilização se refere a uma consciência ambiental de fato, que não precisa do adjetivo “verde” para existir. Segundo Barthes (1985, p. 50), “os significados implicam, por parte dos consumidores de sistemas – os leitores -, diferentes saberes (segundo as diferenças de “cultura”), o que explica que uma mesma lexia possa ser diferentemente decifrada segundo os indivíduos, sem deixar de pertencer a certa língua. Vários corpos de significados podem coexistir num mesmo indivíduo determinando, em cada um, leituras mais ou menos “profundas."

assista o vídeo em: http://www.youtube.com/watch?v=Bg0QminAPMM

The Green Song (Tradução)

O meio ambiente está morrendo
Precisamos de uma solução rápida
Se não inventarmos um grande plano
Ele simplesmente não durará
Nós não queremos assustar ninguém
Nós não queremos fazer uma “cena”
Nós preferiríamos varrer para debaixo do tapete
Mas em vez disso vamos pintar de verde

Verde, verde, verde
Vamos pintar de verde

Não importa na verdade o que é
Ou o que faz, ou porque dói
E o que significa, contanto que seja verde
Não importa na verdade o que ele queima
E o que ele faz, e o que ele mata
Contanto que seja verde

Verde, verde, verde
Vamos fazer isso verde

Políticos nos embalam com projeções
Celebridades são as mesmas
Só importa o quanto são verdes
E quem merece ser culpado
O quanto verde você é, e não quanto você doa
O quão amado você é, é como você vive
Você conhece o verde então pense nisso
Porque você não precisa ser “verde” para ser “verde”



Referências

BARTHES, Roland. Elementos de Semiologia. São Paulo: Cultrix, 1985.

SANTAELLA, Lúcia. O que é Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2002.
Revista Veja, veiculada em 26 de maio de 2007

Artigo: SILVA, Marcio Renato Pinheiro da. Lição crítica: Roland Barthes e a semiologia do impasse. Rio de Janeiro: Alea, vol. 7, 2005.
(retirado de: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1517-106X2005000100005&script=sci_arttext)

Site: http://www.faac.unesp.br/eventos/jornada2005/trabalhos/15_francisco_machado.htm

domingo, 9 de novembro de 2008

Pão, gergelim e semiótica


Talvez seja difícil encontrar alguém que ainda não conheça a frase “uma imagem vale mais que mil palavras”. E apesar das divergências quanto a essa afirmação, é fato que determinadas imagens, produzidas ou não, podem causar impacto maior que um texto de mil palavras (ou mais). É importante esclarecer que esta discussão não objetiva atribuir um valor superior ou inferior a nenhuma dessas duas formas de expressão mencionadas, já que cada indivíduo tem preferências por texto ou imagem, e dependendo das situações, a união desses dois elementos é fundamental para a compreensão da mensagem que um anunciante, por exemplo, deseja transmitir.

O presente estudo coloca em questão a especificidade da imagem publicitária em relação a outros tipos de imagem. Como foco desta análise, foi escolhida a imagem de uma das campanhas da rede de fast-foods “McDonald’s”. Neste caso, a Semiótica funciona como instrumento para a percepção dos elementos presentes nessa imagem, utilizados para induzir o observador ao consumo. O nome semiótica vem da raiz grega semeion, que quer dizer signo. “A Semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno de produção de significação e de sentido." (SANTAELLA, 1983, p.13)

A empresa americana McDonald’s, considerada por muitos como um símbolo do “capitalismo selvagem”; por outros, um típico enlatado americano, também é constantemente apontada como responsável por deixar a população menos saudável e mais “gordinha”. Mesmo assim, continua investindo pesado em campanhas publicitárias de forte apelo visual, o que poderia explicar grande parte do sucesso de vendas. Com a imagem de um bebê recém-nascido sendo amamentado, o pão com gergelim, que representa a característica principal e peculiar dos lanches McDonald’s, imita o seio da mãe. Tendo em vista que a empresa é alvo de críticas ferrenhas por promover hábitos alimentares não-saudáveis, a imagem produzida é bastante ousada.

Além disso, é importante atentar para a expressão do bebê, com semblante tranqüilo, parece não notar a diferença entre o seio e o pão. As cores fortes, principalmente das bochechas, levemente rosadas e vermelhas, aproximam-se dos tons das cores quentes presentes no próprio símbolo do McDonald’s, bem como de várias outras marcas de alimentos. Basta observar as praças de alimentação dos shoppings, onde predomina a combinação de cores fortes como a vermelha e a amarela. Mas neste caso, o aroma também ajuda a chamar a atenção e a despertar a fome de quem estiver passando por ali.

Texto: Juliana Jovanelli

Referência:
SANTAELLA, Lucia. O que é Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1983.

Imagem disponível em “Google Imagens”

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Ressignificações semióticas na avifauna



No enfado dos compromissos cotidianos, poucas pessoas se ateriam a ouvir ou “rastrear com o olhar” a profusa diversidade de pássaros em território urbano. Ouvi-los ou olhá-los implica pausas na faina diária incluindo afeição a essas criaturas. Mas há, pronunciadamente, denotada significação1 na presença passeriforme da cidade.
Semelhante à música, que sem a musicalidade não expressa a intenção do compositor de construir por meio do som uma “geografia” na mente do ouvinte, os sons da avifauna decrescem no rush cotidiano caracterizando uma original entropia semiótica2. Um cantor pop não arranjaria seu repertório numa guarânia, nem um violeiro expressaria sua ruralidade em riffs de rock. E desse predicado há na Criação. Naturalmente, faz parte do “arranjo” do pássaro o bioma em que vive, por seus meandros, composição e ressonâncias. E nós podemos culturalizar3 combinações harmônicas, como em qualquer latitude se harmoniza o grasnar da gaivota à arrebentação de ondas do mar. Não é usual numa metrópole ouvir pássaros no depoimento tácito que segue a sonoridade dos trinados – a significação do canto passeriforme da cidade: o habitat natural da avifauna está sendo ocupado, e decorre-se daí a migração espontânea a outras paragens, na contínua obediência de cumprir o instinto da perpetuação. Em ver passarinhos num festejo resignado se constata: um som pode dissimular um silêncio.
Pela localização, no campus da UEL, universidade em que estudo, povoa uma polifonia multiforme de vozes de aves, corporificando um fugaz calendário natural. Surpreende, porém, numa apreensão análoga à de ouvir em solo de piano “o milionário”, de Os Incríveis. Mas, particularmente, ouvir pássaros em área urbana traz reminiscências de fragmentos rurais.
Assim, o sabiá relembra ribeiros e copada de árvores em que evolui sua melodia. O tiziu lembra seus pousos efêmeros nos algodoeiros, trazendo à recordação a lida na roça. O crocito e as revoadas do carcará traduzem iminência, inquietando a passarada. O chupim simboliza em seus trilos a argúcia, com sua fêmea a botar ovos em ninho alheio. Cada espécie que adota a cidade revela o estreitamento do seu habitat, solicitando uma necessária abordagem etnoornitológica4 compreensiva.
O canto dos pássaros é multirrelacional e atina sentidos. Representaria na cidade um repertório diferente de significações. O canto e o comportamento da avifauna prenunciam acasalamento, época de frutas, estações e orientação pluvial prevalecente. Remetem ao amanhecer do campo, ao silêncio de estradas rurais, à infância e as lendas e crendices. Lembram fatos e histórias. São uma construção de significados e em um mínimo que seja corroboram nossa percepção.

Texto e Imagem: Osias Sampaio

Referências:

1, 2 NETTO, J. Teixeira Coelho. Semiótica, Informação e Comunicação.
São Paulo, Editora Perspectiva, 1980.

3 Conceitos Centrais, Cultura.
Disponível em http://www.pucsp.br/pos/cos/cultura/conceito.htm.
Acessado em 6 de novembro de 2008.

4 FARIAS, Gilmar Bezerra de; ALVES, Ângelo Giuseppe Chaves. Aspectos Históricos e Conceituais da Etnoornitologia.
Disponível em http://www.biotemas.ufsc.br/pdf/volume201/p91a100.pdf.
Acessado em 6 de novembro de 2008.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O erotismo semiótico



“Confira a poupança onde Calheiros fazia as aplicações”. Uma simples frase associada a uma fotografia estampada em um outdoor demonstra uma pluralidade de significados e significantes; todos relativos à bagagem cultural, experimental e informacional de quem se depara com a mensagem – tanto textual como visual – da peça publicitária.

A análise presente se baseia na Semiótica, que, segundo Santaella (2002, p.13), “tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e sentido”. Assim, tanto a frase escrita e a fotografia se portam como signos, uma vez que “um signo intenta representar, em parte pelo menos, um objeto que é, portanto, num certo sentido, a causa ou determinante do signo, mesmo se o signo representar seu objeto falsamente” (SANTAELLA, 2002, p. 58).

É interessante entender que um signo não é somente falado e ouvido, podendo ser apenas visualizado. Santaella (1995, p. 11) afirma que “[...] é enorme a profusão de signos distintos dos verbais. Cada um deles só será compreendido se for respeitado na sua diferença”.

A descrição do outdoor publicitário específico se baseia em uma fotografia de uma figura feminina, aparentemente nua, sentada sobre uma cadeira virada, localizada à esquerda da cena. Em contraponto, do lado direito, há a frase citada. Um pouco abaixo aparece o nome da garota. E somente no canto direito inferior é possível ver o logotipo do anunciante e a data do produto. Tudo é bem destacado, uma vez que o fundo de cor preta atrai a atenção do público aos objetos descritos.

A mulher, com suas expressões e posicionamento, concede um sentido erótico ao outdoor e age justamente para oferecer o produto – uma revista masculina. Este signo incide na consciência primeira e segunda, uma vez que estimula instintos (primeiridade) e esboça reações (secundidade). Apesar de agir diferentemente de acordo com o sexo do receptor, a maior discrepância de significados remete à bagagem informativa. A mulher em questão é Mônica Veloso, que desencadeou uma crise sem precedentes na história política brasileira. O conhecimento ou não do caso inicia o processo de desvelamento da propaganda.

A imagem é um dos principais pontos desta mensagem publicitária. Segundo Barthes (1990, p.28) “[...] se a imagem contém signos, teremos certeza que, em publicidade, esses signos são plenos, formados com vistas a uma melhor leitura: a mensagem publicitária é franca, ou pelo menos, enfática”.

Porém, é a associação entre imagem e texto que completa o sentido. A presença do slogan-legenda é uma mensagem lingüística, que serve para fixar o significado anteriormente reproduzido e, mais do que isso, ter a certeza de que o leitor conseguiu obter a significação pretendida. A palavra “ajuda a identificar pura e simplesmente os elementos da cena e da própria cena: trata-se de uma descrição denotada da imagem” (BARTHES, 1990, p. 32). E neste caso não é diferente.

Uma reportagem da revista “Veja”, veiculada em 26 de maio de 2007, revelou que o presidente do Senado, Renan Calheiros, recebia recursos da empreiteira Mendes Júnior, por meio de um lobista, para pagar pensão à jornalista Mônica Veloso, com quem teria uma filha fora do casamento. O caso se desenrolou por meses, nos quais novas denúncias acabaram surgindo contra o senador.

Uma história a parte passou a ser vivida pela jornalista Mônica Veloso, que passou a ser considerada uma celebridade, dar entrevistas em programas de fofocas e culminou com a assinatura de um contrato para posar nua. É exatamente o outdoor publicitário desta publicação que está sob análise.

Após o público ser afetado pela montagem da peça – incluindo a garota e a estética da cena – em seus instintos, acontece um maior ou menor grau de erotismo dependendo do conhecimento do receptor. É a ação no terceiro nível da consciência, baseada na interpretação e na inteligibilidade (terceiridade). O público que souber quem é Mônica Veloso e entender a frase “Confira a poupança onde Calheiros fazia as aplicações” (frase inclusive repleta de duplo sentido, uma vez que “poupança” e “aplicações” podem ter sentidos econômicos ou sexuais) se interessará mais pela revista.

Quem acompanhou o caso pela imprensa e encontrou frequentemente Mônica Veloso, toda formal, envolvida em uma crise política, entenderá a potencialidade erótica que sua aparição em uma revista masculina pode causar. É um claro exemplo da publicidade utilizando do erotismo e, deste último utilizando a interpretação do público para se otimizar.

A análise por meio da semiótica constitui um importante instrumento para que qualquer processo comunicativo seja revelado. Quando este meio é a publicidade, baseado principalmente na persuasão, esta análise se torna ainda mais importante por mostrar ao público ao que ele está exposto de modo muitas vezes inconsciente. É possível perceber que mesmo o erotismo, que parece ser um instinto natural, pode ser trabalhado e atingir em maior ou menor grau de acordo com a bagagem cultural e informacional do receptor e as conseqüentes inserções em seus níveis da consciência.

Texto: Vitor Oshiro

Referências

BARTHES, Roland – O óbvio e o obtuso: ensaios críticos. Tradução de Léa Novaes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.

SANTAELLA, Lúcia. A Teoria Geral dos Signos: Semiose e Autogeração. São Paulo: Ática, 1995.

SANTAELLA, Lúcia. O que é Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2002.
Revista Veja, veiculada em 26 de maio de 2007

Site http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u327862.shtml acessado no dia 01 de novembro de 2008

Site http://desenblogue.com acessado no dia 01 de novembro de 2008

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Na Câmara de Barthes


O que atrai a sua atenção em uma imagem? O que torna uma fotografia tão especial? O que nos encanta, a fotografia em si ou o que nela é reproduzido? Assim como olhar para um reflexo, a atenção é dirigida ao que ele reproduz, e não ao objeto que está reproduzindo.

Em “A câmara clara”, de Roland Barthes, o autor conta como começou seu interesse pelo objeto fotografia, e não necessariamente para as imagens. Mas a dificuldade estava exatamente por ele trazer consigo o seu referente. Apontamos uma foto e dizemos: “olhe, este é meu irmão”.De início, Barthes estabelece o tempo. “O que a Fotografia reproduz ao infinito só ocorreu uma vez”, e nunca se repetirá. Particular absoluto, contingência soberana, ocasião, encontro, real, são expressões utilizadas para nomear esta característica.

A fatalidade que implica a fotografia ser “invisível”- então precisa ter alguém ou alguma coisa -, somada ao seu particular absoluto fazem com o autor chegue a uma pergunta. “Por que escolher (fotografar) tal objeto, tal instante, em vez de tal outro?”

Partindo da vontade de escrever sobre este assunto, Barthes resolveu fugir ao convencional da época – o livro data de 1979, publicado no ano posterior -, dividido entre técnicos e históricos ou sociológicos. Exatamente por isto, conta o autor, “eu me encontrava num impasse, e se me cabe dizer, ‘cientificamente’ sozinho e desarmado”.

Resistindo aos sistemas redutores, Barthes tornou-se o sistema redutor de sua obra, e assim começou caminhar. Quem opera (operator), é o fotógrafo. Todos somos expectadores (spectator) enquanto público. Os alvos, o objeto fotografado, o espectro (spectrum). Esta última palavra, lembra, também traz relação com espetáculo e “com o retorno do morto”.

Barthes conheceu apenas os últimos papéis, não tendo paciência para esperar para ver o resultado daquilo que fotografou – naquela época em que o mais imediato e, para ele, decepcionante, era Polaroid.

Como spectrum, no entanto, lembra do momento em que, ao ser fotografado, “tudo muda: ponho-me a ‘posar’, fabrico-me instantaneamente um corpo, metamorfoseio-me antecipadamente em imagem”. Neste momento, passa-se de sujeito a objeto.

Observando que não consegue gostar de todas as fotos de um mesmo fotógrafo, Barthes identifica os momentos em que uma foto o “anima”, como uma aventura. O primeiro, é o studium – ligado a estudo, cultura, gosto. O outro, o punctum, está relacionado aos pontos sensíveis, “é esse acaso que, nela [fotografia], me punge (mas também me mortificam me fere).” A união leva ao afeto, e este ativa o olhar àquelas fotografias preferidas.

Em sua primeira referência à semiologia nesta última obra, o autor coloca que ela está limitada ao desempenho de alguns retratistas e que nas “boas” fotos resta pensar – “mesmo isso corre o risco de ser sentido como perigoso”. E, acrescenta, subversiva não é “quando [a fotografia] perturba, aterroriza ou mesmo estigmatiza, mas quando é pensativa.”

“A Câmara Clara” é um livro muito pessoal, mais ainda no trecho em que o autor dedica às impressões sobre a única fotografia de sua mãe, já morta, em que Barthes encontra a verdade, e não apenas a identidade dela. A fotografia da mãe criança, não é apresentada como outras citadas no livro, porque esta só tinha sentido para ele.

Nos últimos capítulos, ou dias – há quem acredite que os 48 capítulos foram escritos um a cada dia em forma de diário – Barthes revela os laços entre a fotografia e a loucura. A ligação que inicialmente acreditava ser por paixão a certas fotografias - “o sofrimento do amor”-, depois é reconhecida como piedade causada pelo punctum.Também há a transformação da fotografia em sensata. É o caso da domesticação – da qual o cinema faz parte, critica Barthes – e o da generalização.

E assim, sensata ou louca se dá a fotografia. Barthes possivelmente escolheu aquela que o pungia. E você, qual escolhe?


Poliana Lisboa
fonte bibliográfica:

Barthes, Roland. A câmara clara – Nota sobre a fotografia. Rio de Janeiro, RJ: Editora Nova Fronteira, 2ª edição, 1984.


crédito da foto1: imirante.globo.com

crédito da foto2:engl3890.blogspot.com

O símbolo e o sapato

Semiótica é a ciência geral dos signos. Os estudos de significação vêm desde a Grécia antiga, no entanto somente no séc XX é que começou a ser visto como ciência, com Ferdinand de Saussure e C. S. Peirce. A semiótica é aplicada em qualquer objeto sígnico: música, fotografia, roupas, cinema, romance...
Para pierce há três tipos de signos : o ícone, que representa o objeto, EX: fotografia; o índice é por meio dele que tiramos conclusões, EX: fumaça/fogo; símbolo, estabelece de formaarbitrária a relação entre o objeto e o signo, EX: a palavra cadeira. “Os signos são divisíveis conforme três tricotomias; a primeira, conforme o signo em si mesmo for uma mera qualidade, um existente concreto ou uma lei geral; a segunda, conforme a relação do signo para com seu objeto consistir no fato de o signo ter algum caráter em si mesmo, ou manter alguma relação existencial com esse objeto ou em relação com um interpretante; a terceira, conforme seu interpretante representá-lo como um signo de possibilidade ou como um signo de fato ou como um signo de razão.”
como prova de que a semiótica se aplica a qualquer coisa, fica como análise um episódio do seriado Sex and the City, intitulado de “O direito das mulheres de comprar sapatos” (6º temporada). Neste episódio a heroína da série Carrie Bradshaw, é convidada para uma festa do nascimento de um filho de uma antiga colega, Kyra, uma fotógrafa de sucesso que largou a vida badalada para se tornar mãe de três crianças.
Ao chegar à festa Carrie é obrigada a retirar os seus sapatos, que ela prefere chamar de “Manolo’s” (por causa da marca). Ao fim da festa seus sapatos foram roubados. A tristeza de Carrie a leva procurar Kyra, para saber se foram achados, a dona da casa se oferece para pagar e ao ouvir o valor 485 dólares, se recusa, Carrie fica muito embaraçada, e a “colega” diz que pagará metade, pois não é dever dela pagar pelas extravagâncias de Carrie, esta rebate “não foi minha escolha tirar os sapatos”.
Bradshaw começa a se questionar se é errado ter sapatos em vez de filhos, e faz as contas do quanto já gastou presenteando as escolhas de Kyra (noivado, casamento e presentes pra três crianças), e resolve tomar uma decisão: pega o telefone e deixa um recado: “Oi aqui é Carrie Bradshaw, queria dizer que estou me casando.... comigo mesma! A lista de presente está na Manolo Blahnik!” ao desligar o telefone a heroína comenta “ um pequeno gesto em nome das mulheres solteiras”.
Aqui o sapato não é apenas uma parte do vestuário, mas sim representa uma mulher que faz escolhas, independente e que não se deixa abater por nada. Carrie toma uma decisão em nome de muitas, ter sapatos não é um pecado, e ela exerce o seu direito de reaver o que lhe foi roubado.
Frase do episódio: “às vezes é difícil ser uma mulher solteira, por isso é preciso sapatos especiais, para tornar nossa caminhada um pouco mais divertida”. Carrie Bradshaw.
texto: Karina Rocha

domingo, 2 de novembro de 2008

A perseguição de Wes no filme “O Procurado”

Um dos ingredientes que prendem o espectador na poltrona, durante os filmes de ação, são as altas doses de adrenalina e de velocidade. Nesse quesito, “O procurado”(2008) não deixa a desejar. O filme narra a história de Wesley Gibson (James McAvoy), um jovem administrador frustrado, que é perseguido pelo assassino de seu pai. Para reverter a situação e perpetuar os passos do pai, ele é forçado a entrar na comunidade secreta de assassinos, a Fraternidade, para adquirir a habilidade de um bom matador. A atraente Fox, interpretada por Angelina Jolie, e o líder Sloam (Morgam Freeman) são elementos que atuam durante todo o processo vivenciado pelo jovem.


Segundo a lógica de Pierce, o personagem Wes assume uma natureza triádica, que pode ser analisado em si mesmo, na referência ao que ele indica, e nos efeitos de interpretação que ele pode produzir. Neste caso, ele é ícone, pois, sua imagem na tela tem semelhança com o objeto representado, ou seja, com o personagem. Ele é índice, ao denotar suas atitudes por meio de pensamentos e transformá-las em ação. Além disso, o filme indica as semelhanças que ele carrega do pai (características físicas e principalmente de personalidade). Wes também é símbolo, ou seja, a princípio símbolo da mediocridade de um simples trabalhador, que depois se transfigura numa pessoa destemida e forte. O filme “O procurado” em si, é o objeto de um signo, ou seja, da História em Quadrinho Wanted, de Mark Millar e J.G. Jones que originou a obra cinematográfica.
É importante ressaltar que SANTAELLA
(2007, p.13) faz o “exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno de produção de significação e de sentido”, que neste caso, tiveram origem nas HQs.

De acordo com os estudos apresentados pelo semioticista Pierce, ainda é possível notar a primeiridade, revelando o simples Wes; a secundidade, ao notar o início das alterações de conduta e pensamento, aderindo ao estilo da Fraternidade. Já a terceiridade, mostra esse conjunto de mudanças no perfil do jovem, possibilitando ao espectador fazer a leitura que lhe convém a cerca do novo estereótipo que surge nas telas.


A cena analisada mostra Wesley fugindo da aparente representação do mal, figurado por Thomas Kretschmann, quando surge Fox num carro ágil para salvar o garoto. Com uma manobra Wes é colocado dentro do carro enquanto o perseguidor está em um caminhão atirando contra os dois. Angelina Jolie, fica com as pernas fixas dentro do carro e o restante do seu corpo está para fora, para poder atirar no perseguidor. Nesta cena, é possível admitir que o carro assume a primeiridade, enquanto a secundidade é a alta dose de velocidade e a terceiridade é toda a perseguição que gera ansiedade pelo desfecho.


Um dos tiros que saem do perseguidor contra o carro remete à trilogia Matrix, no mecanismo clássico usado no filme, ao fazer um big close na bala de revolver, fazendo uso do delay (que retarda a sua velocidade e mostra com precisão o trajeto realizado). Mas, em “O procurado”, a trajetória da bala é curva. Neste caso MOSCARIELLO (1985, p. 17) defende que “a câmera pode igualmente ligar factos pertencentes a diferentes dimensões temporais [...] mas que se refere à um acontecimento ocorrido no passado e que se liga ao primeiro através de uma recordação neutra invocada através de um objeto de dupla referência espacio-temporal”. Além disso, dentro da temática de diferentes dimensões de contexto, o início da fuga, mostra Wes correndo de modo semelhante ao Homem Aranha, no momento de usar sua identidade de super-herói, revelando mais uma referência à outra obra do cinema.

Assista ao trailer:
http://www.youtube.com/watch?v=_79RP5I0F_U


texto: Georgia Pereira


referências bibliográficas:

MOSCARIELLO, Ângelo, Como ver um filme, Editorial Presença, Lisboa 1985
SANTAELLA, Lucia, Semiótica Aplicada, São Paulo, Pioneira Thomson Learning, 2007.